Depois de uma longa caminhada numa tarde ensolarada de quarta-feira
entrei no Museo Nacional de Bellas Artes, em Buenos Aires. Queria lavar o
rosto e fazer xixi antes de mergulhar naquele universo que estava sendo
exposto no local e que foi um dos principais motivos de ter feito
aquela viagem: o de Julio Cortázar, através das mostras Los otros cielos e Los fotógrafos: ventanas a Julio Cortázar.
Subi
até o segundo andar e perguntei para um senhor de olhar terno e bigode
simpático que trabalhava lá onde ficava o banheiro. Ele não só disse
onde ficava o local, como se levantou do banco onde estava acomodado e
me acompanhou, gentil, até lá perto. Cumprida minha primeira missão,
resolvi, então, começar a visita naquele piso, onde se encontrava uma
sala com várias fotografias do escritor. Não tenho o costume de
fotografar o acervo das exposições que visito, mas a ocasião era mais
que especial, então fiz questão de registrar aquilo.
Quando saí da sala para retornar ao piso inferior, o senhor que me mostrou o caminho do banheiro veio em minha direção:
Desculpe a intromissão, mas vi você fotografando os retratos do Cortázar, você deve gostar muito dele, não é?
Respondi que sim.
Você não pode deixar de visitar o restante da exposição. Tem até uma máquina de escrever dele.
Sim, pode deixar. Eu vim aqui exatamente para isso.
De onde você é?
Disse
que tinha vindo de São Paulo, que aquele era o meu primeiro dia na
cidade e que minha intenção era visitar as exposições que comemoram o
centenário do escritor (Año Cortázar 2014). Ele ficou muito feliz e,
sorridente, agradeceu por eu ter feito essa “gentileza”.
Falamos
sobre como gostamos da maneira ritmada que Julio escrevia, sobre o
jazz... e acabei falando que eu gosto muito de escrever e que ele é uma
grande referência para mim.
Eu sabia, eu vejo nos seus olhos uma sensibilidade e uma boemia que só os escritores têm.
Eu sorri e disse que ia seguir a visita. Ele me deu boas vindas, desejou sorte e tudo de melhor na minha vida.
Encerrou declarando seu amor pelo escritor:
Cortázar é tudo o que temos.
Acho que é tudo o que eu tenho também.